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Doutor não é quem tem doutorado, é quem sobrevive a ele!

  • Britto, R.S.
  • 29 de out. de 2017
  • 4 min de leitura

Tentáculos da pós-graduação

Ontem no facebook me senti motivada a publicar sobre pós graduação depois de ler um texto sobre o suicídio cometido por um aluno da USP e um texto em um outro blog, alem claro de também ser um assunto e problema que tem me rodeado a alguns meses, se não anos, e que eu sempre tive uma certa vontade de cuspir pra todos lerem e saberem da parte não glamurosa do ser Dra!


No facebook infelizmente, por ter conectado a minha rede de amizades orientadores, coordenadores e professores, preferi falar menos do que eu gostaria. Tentei simplesmentedeixar meu recado, e critícas sem provocar maiores sentimentos ou inícios de discussões.


Também Infelizmente acho que esses textos com uma certa critica ao atual sistema de coordenação e jeito de orientar alunos, mesmo trazendo exemplos de doenças como depressões e síndromes de pânico ou até a morte, não irão surtir efeitos em quem devia. Curiosamente, NENHUM dos contatos que tenho no facebook de professores e membros da coordenação de PPG curtiram, nem comentaram nada. Ao meu ver o problema seguirá existindo e aumentando enquanto eles acharem que nossas reclamações e sofrimentos forem bobagem e que eles ESTÃO sempre certos.


As vezes orientadores tem aquela mentalidade quadrada que pais meio despreparados também demonstravam as vezes, a mentalidade de que se ele viveu, conviveu e passou aquilo e sobreviveu ou teve sucesso nós não pudemos reclamar. Acredito que eles partem do pressuposto que todos sentem aquilo da mesma maneira ou que aquilo gera o mesmo prazer ou desprazer de igual forma pra todos.

Convenhamos se assim fosse, ou só existiram doutores tranquilos, felizes hiper conscientes da escolha que fizeram ou então todos que sofressem iam pular fora da carreira quando se dessem conta da merda que fizeram, ou acabassem mortos como o próprio aluno da USP.


Orientar alguém durante a acadêmia não é formar uma pessoa para que ela seja perfeita, de acordo com o padrão científico da sociedade acadêmica, nem formar uma pessoa que seja maquina de trabalho braçal no laboratório ou que tenha grande sucesso na aceitação de seu conteúdo escrito em manuscritos. Um aluno não pode ser bom pra ninguém, ele tem que ser instigado a ir atrás do melhor que ele possa ser, até onde ele mesmo julgar querer. As vezes o que é pouco pros que orientam é algo que já fizemos o quase impossível para conseguir alcançar, indo muitas vezes contra a nossa vontade e habilidade, o que consequentemente nos tira saúde mental.


As pessoas acabam por se autodestruir na procura de um "ser melhor" que nunca atingirão, e nessa procura acabam sofrendo todos os dias como o peixe que julgava ser incapaz pela sua inabilidade de subir em árvore.


Digo mais! Acho que sofremos pressão e incompreensão não só da sociedade acadêmica, mas também da sociedade em geral que vive achando que nosso trabalho é estudo, e que tudo faz parte. Mas o que mais me dói no fundo é quando comentamos sobre o dia-a-dia do pós graduandos falando das cobranças,da horas de trabalho(todos os turnos, sem finais de semana ou feriado),da insatisfação demonstrada diante dos resultados que conseguimos, da pressa nas análises...e sempre tem um que nos fale, acredito que na intenção de nos consolar: -AHHHHHHHH MASS QUALQUER EMPREGO É ASSIM! E assim recomeça aquela mentalidade de pra viver tem topar sofrer e aceitar, e se morrer por que não conseguiu aceitar e conviver com isso, ORA... paciência, afinal a morte também é consequência da vida.


Por fim uma outra crítica que levanto é o quanto a sociedade em geral acaba esperando da gente mesmo depois que sobrevivemos aos 4 anos, e nos tornamos doutores.

Conhecidos sempre me questionam porque eu não faço concurso para o ensino superior...se eu não tenho vontade de ser professora, já que eu tenho doutorado, tentando deixar evidente que " a partir de agora fica fácil!" .

Fato é que a realidade que chega a todos é distorcida. Primeiro que eles não imaginam que pelo menos nas biológicas, somos em média 30 ou 40 doutores por uma vaga, além disso desconhecem o sistema, não sabem que para conseguir a vaga de professor de universidade pública não é preciso apenas ter o título e dar a melhor aula no concurso, também é necessário ser o melhor sobrevivente da pós graduação e principalmente seguir na academia por mais anos e anos pondo sua cara e corpo a tapas na vida de pós doc para ter publicações que lhe darão um valor evidenciado por qualis e outros números. Então o dia que professor não precisar da pesquisa (e toda essa crueldade mental que isso envolve) ai quem sabe a gente consiga fazer tudo com gosto, cada um em seu tempo, por sua própria motivação.

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Hoje eu me libertei da academia, trabalho nos últimos ajustes dos manuscritos da minha tese para ter direito a emissão do título, declinei uma possibilidade de bolsa de pós-doc, recomecei uma nova graduação. E mesmo vivendo com toda a frustração de tempo perdido, do insucesso naquela profissão e falta de dinheiro, hoje passo os dias sem toda a angustia que por 10 anos carreguei, sem necessidade.

 
 
 

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